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Por outro mundo possível!

Por outro mundo possível!
Paloma Silveira
jan. 3 - 6 min de leitura
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E chegamos na reta final de 2021 e de quase dois anos de pandemia. Aqui no Brasil, além da pandemia vivemos tempos distópicos de múltiplas crises: social, econômica e humanitária, milhões de pessoas na miséria. Podemos constatar esse recrudescimento da pobreza nas notícias veiculadas em algumas mídias, com gentes buscando alimentos em caminhões e latas de lixo, nas filas de açougues esperando ossos, sobrevivendo, como podem, nas ruas das cidades. Voltamos para o mapa da fome. Em Recife e Salvador, duas cidades que habito, ao transitarmos pelas ruas nos deparamos com famílias inteiras nas calçadas, nos semáforos, pedindo e/ou com placas gritando: estou com fome, me ajude. As gentes com fome não apenas de alimentos, as gentes famintas de vida digna. Enquanto isso, o orçamento para 2022, aprovado recentemente, prevê 4,9 bilhões de reais para o fundo eleitoral, outros 16,7 bilhões para o orçamento secreto, continuando precário para as tantas misérias brasileiras:

É bem verdade que o Brasil, o mundo capitalista racista, patriarcal e classista, nunca esteve muito aí para essas pessoas? O sistema se fundamenta na miséria de muites para a riqueza/luxo de pouquíssimos. Isso ficou ainda mais evidente na pandemia, já que os ricos ficaram mais ricos, com alguns viajando para o espaço pela bagatela US$ 28 milhões (PULICE, 2021). Uma perversão.

A elite brasileira colonial desnudou, sem pudores, as diferentes nuances de seu masoquismo. Em conluio com parcelas significativas da política institucional, destruíram quase tudo das políticas de saúde e sociais, da educação pública, da ciência brasileira e, apesar da CPI da COVID-19, das milhares de mortes evitáveis, dos diferentes horrores desse desgoverno, continuam apoiando o antipresidente* neofascista. Não é à toa que os vários pedidos de impeachment repousaram e continuam repousando na cadeira dos presidentes da Câmara dos Deputados. Espelham-se. Para coroar essa relação, temos ainda uma nova ofensiva aos direitos trabalhistas tramitando. Não basta retirar, é preciso liquidar e precarizar muito mais as condições de trabalho, as vidas das trabalhadoras e dos/es trabalhadores brasileires (REMIR-ABET, 2021).

Não existem limites e muito menos escrúpulos, poder e dinheiro são os combustíveis que movem a expansão desenfreada desse mundo capitalista brutal e cada vez mais excludente, e inóspito. É o que realmente importa. Nem o colapso ambiental que estamos vivendo está sendo capaz de produzir ações mais efetivas que não sejam os aclamados e insuficientes desenvolvimento sustentável? E a economia verde? É necessário muito mais: “é preciso combater um quarto negacionismo: aquele que recusa admitir a incompatibilidade da lógica da mercadoria, do dinheiro e do capital com a manutenção da própria vida” (BOTELHO, 2021).

É dentro desse contexto local/global nefasto que 2022 desponta. Ano de eleições presidenciais no Brasil, ano importante, decisivo para nós. A polarização política e social tem produzido diferentes violências e rupturas dentro das sociedades, projetando horizontes difíceis. Essa tensão social não é privilégio nosso, assistimos no início desse ano o que aconteceu nas eleições presidenciais dos Estados Unidos. País do dito primeiro mundo civilizado, com instituições e democracia consolidadas? teve o capitólio, sede do legislativo federal, invadido por apoiadores do ex-presidente Donald Trump, durante a sessão que certificaria a vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais. Incitados/as pelo ex-presidente, os/as manifestantes entraram em confronto com os guardas e cinco pessoas morreram (SANCHES, 2021).

Como “boa colônia” que ainda somos, a probabilidade que algo semelhante aconteça, sendo até pior, não é remota. Além do complexo de vira-lata encarnado por parcelas da sociedade brasileira, temos o antipresidente da necropolítica e da violência, que tem Trump como um de seus ídolos. Para piorar nossa situação, antevendo a sua derrota, o antipresidente tem questionado as urnas eletrônicas, continua esbravejando seus horrores como a pessoa má que é, faz uso das religiões de matizes mais conservadoras e assim vem mantendo os 20% a 30% de apoiadores/as. Espelham-se também. Uma mistura de sentimentos se faz presente nesse final de ano e uma pergunta inevitável aparece: Como será esse 2022?

A vitória de Boric no Chile e os ventos latino-americanos que vêm de lá, da Colômbia, da Argentina e daqui também com as diferentes resistências e manifestações que foram às ruas nos são/foram revigorantes. Precisamos que 2022 seja diferente. O mal não pode continuar sendo tão banalizado, tão naturalizado, a ponto de se tornar tão comum que a gente espelhe apenas as brutalidades humanas. Não é esse mundo e essa sociedade que queremos viver e deixar para as novas gerações. Como as artes sempre nos salvam, resgato essa linda música, escrita nos tempos de chumbo da ditadura militar brasileira, para que não tenhamos medo de construir outro mundo possível nesse 2022.

Tudo o que você podia ser

Lô Borges / Marcio Borges

Com sol e chuva você sonhava

Queria ser melhor depois

Você queria ser o grande herói das estradas

Tudo que você queria ser

Sei um segredo

Você tem medo

Só pensa agora em voltar

Não fala mais na bota e do anel de Zapata

Tudo que você devia ser

Sem medo

Não se lembra mais de mim

Você não quis deixar que eu falasse de tudo

Tudo que você podia ser...

Na estrada Ah!

Sol e chuva

Na sua estrada

Mas não importa, não faz mal

Você ainda pensa e é melhor do que nada

Tudo que você consegue ser...

Ou nada

Não importa, não faz mal

Você ainda pensa e é melhor do que nada

Tudo que você consegue ser...

Ou nada

*Termo utilizado pela jornalista Eliane Brum para se referir ao atual presidente.

Referências BOTELHO, M. Entenda como a crise do capitalismo aprofunda o colapso ambiental em nosso planeta. 2021. Disponível em: https://dialogosdosul.operamundi.uol.com.br/amp/meio-ambiente/71132/entendacomo-a-crise-do-capitalismo-aprofunda-o-colapso-ambiental-em-nosso-planeta.

PULICE, C. Quanto custa viajar para o espaço, como fez o homem mais rico do mundo? 2021. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/07/24/quanto-custa-viajar-para-oespaco-como-o-homem-mais-rico-do-mundo.htm.

REMIR-ABET. Trabalho: Bolsonaro ensaia a “Reforma” insana. 2021. Disponível em: https://outraspalavras.net/trabalhoeprecariado/trabalho-bolsonaro-ensaiareforma-insana/.

SANCHES, M. Invasão do Congresso nos EUA | 'Banho de sangue é inevitável às vezes': por dentro do ato que levou a invasão histórica e estado de emergência em Washington. 2021. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-55572422.

 

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